Com informações da Agência Fapesp - 22/03/2021
Dopagem
Uma equipe do Brasil e dos EUA desenvolveu um método para usar a conhecida técnica de dopagem para melhorar os cada vez mais promissores transistores de molibdenita.
A dopagem consiste na introdução de outros elementos químicos no silício cristalino, substituindo um átomo original, que é removido, para ajustar as propriedades dos transistores às necessidades de funcionamento de cada um - este é um processo essencial em toda a eletrônica atual.
Mas em materiais bidimensionais, ou lamelares, como o grafeno e a molibdenita, essa substituição de um átomo original do material por outro cria "defeitos" em demasia no material, o que acaba atrapalhando a condutividade elétrica, em vez de melhorá-la.
Dopagem da molibdenita
Uma equipe das universidades Presbiteriana Mackenzie, no Brasil, e da Pensilvânia, nos Estados Unidos, desenvolveu agora um método para usar alguns poucos átomos de ouro para melhorar a eficiência de transistores feitos de dissulfeto de molibdênio (MoS2), um material que vem chamando a atenção da indústria nos últimos anos por suas propriedades eletrônicas e ópticas.
O grupo aplicou átomos de ouro sobre um transístor de MoS2 e, com isso, conseguiu melhorar não apenas a condutividade elétrica do componente, como também sua condutividade térmica, o que é ótimo para extrair o calor dos chips.
"O MoS2 é um dicalcogeneto de metal de transição [TMD, na sigla em inglês] formado por dois átomos de enxofre, que é um calcogênio, para cada átomo de molibdênio, o metal de transição. Esse material forma um cristal bidimensional, tal qual o grafeno. Tanto o MoS2 natural quando o grafite [de onde se obtém o grafeno] são o que chamamos de materiais lamelares, pois ocorrem em lâminas, sendo possível realizar uma delaminação e chegar a uma única camada. O interessante desse grupo é que vários deles, inclusive o MoS2, são semicondutores," explico o professor Christiano José de Matos.
Dopagem sem substituição
Nos materiais semicondutores é mais fácil controlar a condutividade elétrica do que nos condutores, como o grafeno, por exemplo. "Nos semicondutores, como o silício e o MoS2, é possível controlar a passagem ou não da corrente. Esses materiais são importantíssimos para a eletrônica, cuja base é o código binário 0 e 1; esta é a 'linguagem' dos computadores digitais," descreveu Christiano.
Para evitar que a dopagem "estragasse" muito o material, os pesquisadores evitaram a substituição dos átomos, apenas adicionando os átomos de ouro.
"Usamos os conceitos de uma área da química chamada química de coordenação, na qual, em vez de tirarmos átomos - de enxofre ou molibdênio -, aplicamos átomos de ouro na superfície do material. Dessa forma, possibilitamos a ocorrência de uma interação entre as cargas do MoS2 e do ouro, na qual parte dos elétrons do semicondutor acaba ficando parcialmente aprisionada nos átomos do metal. Os átomos de ouro fazem um papel de retenção de elétrons do material, que então fica com excesso de cargas positivas, passando a ter uma condutividade maior. Assim, oferecemos uma possibilidade de melhorar o controle do dispositivo provocando pouco impacto em sua performance," contou Christiano.
Melhoria elétrica, térmica e óptica
Há uma boa chance de esta nova técnica de dopagem sem substituição - depois de aprimorada e suficientemente estudada - chegar aos dispositivos eletrônicos comerciais, já que o MoS2 e outros materiais lamelares vêm sendo amplamente estudados, inclusive para confecção de transistores, que são os componentes básicos dos chips eletrônicos, responsáveis pela memória, as operações lógicas e os fluxos de comunicação nos computadores.
Além de melhorar a condutividade elétrica, a presença dos átomos de ouro melhorou a condutividade térmica e modificou as propriedades de emissão de luz da molibdenita - a emissão de luz é mais uma aplicação desses novos materiais.
"Nosso trabalho representa um avanço significativo na área, já que o transístor é uma unidade básica para eletrônica binária. O primeiro dispositivo fabricado de grafeno foi justamente um transístor. Só que o grafeno é um condutor. Por isso, o desempenho de um transístor de grafeno, comparado a um transístor de silício, é muito pior no que tange à possibilidade de 'ligar e desligar' a passagem da corrente. Diante disso, naturalmente, os cientistas voltaram os olhos para outros materiais 2D que fossem semicondutores. O MoS2 apareceu como um ótimo candidato e transistores feitos com ele estão sendo cada vez mais estudados," afirmou o pesquisador.