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Eletrônica

Memória magnética ultrarrápida gravada com luz

Com informações da Agência Fapesp - 28/05/2018

Memória magnética ultrarrápida gravada com luz
Um único fóton é capaz de alinhar os spins de 6 mil elétrons em apenas 50 picossegundos, com perspectivas de aplicação na indústria de componentes eletrônicos.
[Imagem: André Bohomoletz Henriques]

Magnetismo induzido por luz

Físicos da USP (Universidade de São Paulo) descobriram uma maneira ultrarrápida de magnetizar a matéria, e com um consumo mínimo de energia.

A magnetização por meio da luz foi obtida em um material semicondutor chamado seleneto de európio - cada fóton de luz ordenou os spins de 6 mil elétrons, um efeito considerado "inesperado e espetacular" por especialistas da área.

"Nosso objetivo foi encontrar novos mecanismos para alterar a imantação de materiais, em escala de tempo ultracurta, utilizando apenas a luz. A novidade da pesquisa foi viabilizar magnetizações muito grandes com quantidades muito pequenas de luz," disse André Bohomoletz Henriques, membro da equipe.

Esta é uma área promissora para aplicações tecnológicas, conhecida como spintrônica. A manipulação do magnetismo em materiais antiferromagnéticos - o seleneto de európio é um deles - é um dos campos de pesquisa emergentes que prometem uma nova geração de dispositivos eletrônicos e computacionais mais rápidos do que a eletrônica tradicional baseada no silício.

Memória antiferromagnética

O interesse nessa categoria de materiais e seus fenômenos associados disparou em 2016, quando uma equipe da Europa e do Japão descobriu como os "spins magnéticos" dos materiais antiferromagnéticos podem ser controlados para criar uma memória digital extremamente rápida.

Apesar do nome antiferromagnético sugerir uma oposição, esses materiais são primos próximos dos materiais magnéticos tradicionais, os ferromagnéticos. Só que o seu magnetismo ocorre em escala atômica, não podendo ser detectado em macroescala.

Naquele trabalho, a equipe controlou a magnetização dos antiferromagnetos usando uma corrente elétrica. No trabalho da USP, ele está sendo controlado por luz, o que é interessante pelo aumento de velocidade e pelo consumo de energia infinitamente menor - antevendo aplicações práticas, isso significaria uma memória magnética ultrarrápida gravada com luz.

A magnetização (ou imantação) de um material decorre do ordenamento espacial dos spins de suas partículas. Na matéria não imantada, os spins dos átomos (resultantes dos spins dos seus elétrons) apresentam-se desordenados. Como se trata de grandeza vetorial, o spin de cada átomo aponta para uma direção arbitrária. Em determinadas situações, a passagem da luz é capaz de ordenar esses spins e, por decorrência, magnetizar completamente um material inicialmente desordenado.

"Isso ocorre porque, ao interagir com um elétron, o fóton o promove de um estado fortemente localizado no átomo para um estado que se estende sobre muitos átomos. O resultado é que, em um intervalo de tempo extraordinariamente curto, de cerca de 50 picossegundos [10-12 segundos], todos os átomos existentes dentro do alcance da função de onda do elétron giram seus spins para uma direção comum, gerando um momento magnético supergigante, de 6 mil magnétons de Bohr. Isso equivale ao momento magnético de 6 mil elétrons com os seus spins apontados todos na mesma direção," explicou Henriques.

Esse efeito extraordinariamente forte é particularmente interessante para futuras aplicações práticas.

Memória magnética ultrarrápida gravada com luz
Esquema mostrando o feixe de luz que faz a "gravação" (pump) e, logo a seguir, o feixe de luz que faz a "leitura" do efeito (probe).
[Imagem: A. B. Henriques et al. - 10.1103/PhysRevLett.120.217203]

Interação antiferromagnética

O seleneto de európio foi escolhido como material pela sua alta suscetibilidade magnética, isto é, à forte tendência dos spins dos átomos de európio a se alinharem sob o efeito de um campo magnético muito pequeno.

"Além de existir interação magnética entre o elétron e os átomos do európio, existe também interação magnética entre os próprios átomos de európio. A interação entre os primeiros vizinhos é ferromagnética - ou seja, favorece o alinhamento na mesma direção e sentido. Porém a interação entre segundos vizinhos é antiferromagnética, favorecendo o alinhamento em sentidos opostos," disse Henriques.

"Essas duas interações quase se cancelam, mas prevalece, por muito pouco, a interação antiferromagnética. Por isso, em condições comuns, o material se apresenta no estado antiferromagnético, sem imantação. Porém, qualquer pequena perturbação, como a presença do elétron, pode interferir nesse delicado balanço de interações e favorecer o estado ferromagnético - isto é, o alinhamento de todos os spins do cristal, na mesma direção e sentido, magnetizando quase instantaneamente o material," acrescentou.

Há diferentes formas de interação magnética. A mais conhecida é a interação dipolar, que caracteriza a atração entre dois ímãs. Mas existe também a interação de troca, que é muito mais forte, e que determina a própria imantação de uma agulha de bússola ou de um ímã de geladeira.

A interação de troca, de origem eletrostática, constitui um fenômeno quântico, decorrente do Princípio da Exclusão de Pauli, sem análogo na física clássica. É esse processo que possibilita a imantação ultrarrápida da matéria por meio da luz, com consumo mínimo de energia.

Bibliografia:

Artigo: Ultrafast light switching of ferromagnetism in EuSe
Autores: André Bohomoletz Henriques, X. Gratens, P. A. Usachev, V. A. Chitta, G. Springholz
Revista: Nature Physics
Vol.: 120, 217203
DOI: 10.1103/PhysRevLett.120.217203
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