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Informática

Inteligência artificial: É possível fazer ciência sem teorias e sem leis

Redação do Site Inovação Tecnológica - 19/02/2021

Ciência sem teorias e leis: Inteligência Artificial faz tudo só com dados
Hong Qin à frente das imagens das órbitas planetárias que ele usou para treinar o programa que interpreta o plasma dos reatores de fusão nuclear.
[Imagem: Elle Starkman/PPPL]

Ciência sem teorias, só dados

Um novo algoritmo - o conjunto de regras codificadas para formar um programa de computador - projetado para prever as órbitas dos planetas no Sistema Solar conseguiu prever o comportamento do plasma que alimenta os reatores de fusão nuclear, que estão sendo projetados para aproveitar na Terra a energia que alimenta o Sol e as estrelas.

São coisas completamente diferentes, mas Hong Qin, do Laboratório de Física do Plasma de Princeton (EUA), aplicou o aprendizado de máquina, a forma de inteligência artificial (IA) que aprende com a experiência, para desenvolver suas previsões.

"Normalmente, na Física, você faz observações, cria uma teoria com base nessas observações e, em seguida, usa essa teoria para prever novas observações," explicou Qin. "O que estou fazendo é substituir esse processo por um tipo de caixa preta que pode produzir previsões precisas sem usar uma teoria ou lei tradicional."

A famosa expressão "caixa preta da inteligência artificial" refere-se ao fato de que esses programas aprendem com os dados de uma forma que não compreendemos - mesmo comportamentos coletivos podem emergir sem que o programador consiga explicar o que está acontecendo.

Ciência dos dados

Qin criou um programa de inteligência artificial e o treinou com dados de observações das órbitas de Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter e do planeta anão Ceres. Juntamente com um programa adicional, conhecido como "algoritmo de serviço", o sistema aprendeu a fazer previsões precisas das órbitas de outros planetas do Sistema Solar sem usar as leis de movimento e gravitação de Newton ou qualquer outra teoria.

Isso já seria bom o bastante, mas então Qin aplicou o mesmo programa, com o mesmo treinamento, para prever o que acontece com o plasma no interior de um reator de fusão nuclear. E funcionou.

"Essencialmente, eu contornei todos os ingredientes fundamentais da Física. Vou diretamente de dados para dados," disse Qin. "Não há nenhuma lei da Física no meio."

Este processo levanta questões sobre a própria natureza da ciência. Os cientistas sempre gostaram de desenvolver teorias que expliquem o mundo, em vez de simplesmente acumular dados. Mas será então que as teorias não seriam realmente fundamentais para a ciência, ou necessárias para explicar e compreender os fenômenos?

"Eu diria que o objetivo final de qualquer cientista é a previsão," disse Qin. "Você pode não precisar necessariamente de uma lei. Por exemplo, se eu posso prever perfeitamente uma órbita planetária, eu não preciso conhecer as leis da gravitação e do movimento de Newton. Você poderia argumentar que, ao fazer isso, você entenderia menos do que se conhecesse as Leis de Newton. Em certo sentido, isso está correto. Mas, de um ponto de vista prático, fazer previsões precisas não é fazer nada menos."

Ciência sem teorias e leis: Inteligência Artificial faz tudo só com dados
Descobrir fenômenos que desobedecem as leis da Física nunca foi um problema; mas abrir mão das leis é uma novidade.
[Imagem: Eugene Kawaluk/University of Rochester]

Universo como um holograma

Qin se inspirou em parte pelo experimento mental do filósofo Nick Bostrom, de que o Universo é uma simulação de computador parecida com a do filme Matrix e que nosso Universo pode ser um gigantesco holograma.

Se isso for verdade, então as leis físicas fundamentais deveriam revelar que o Universo consiste em pedaços individuais de espaço-tempo, como píxeis em um videogame, ou seja, nosso mundo teria que ser discreto, e não contínuo.

Essa visão pixelizada do mundo, semelhante à retratada no filme Matrix, é conhecida como uma "teoria de campo discreto", que vê o Universo como composto por bits individuais, diferindo das teorias tradicionais.

E é assim que os computadores digitais funcionam: Enquanto os cientistas normalmente desenvolvem conceitos abrangentes de como o mundo físico se comporta - uma "visão de mundo analógica" -, os computadores digitais apenas montam uma coleção de pontos de dados, que se resumem a 0s e 1s discretos.

A técnica da caixa preta desenvolvida por Qin nem sequer exige que os físicos acreditem literalmente na conjectura da simulação ou de um Universo formado por píxeis, embora ela se baseie nessa ideia para criar um programa que faz previsões físicas precisas sobre um sistema depois de ter aprendido com outro sistema completamente diferente.

Ciência sem teorias e leis: Inteligência Artificial faz tudo só com dados
Algumas equipes falam em viabilizar um reator de fusão nuclear em 15 anos, mas controlar o plasma em seu interior ainda é um desafio a ser vencido.
[Imagem: Sparc]

Física da fusão nuclear

A equipe do professor Qin está desenvolvendo maneiras de usar teorias de campo discretas para prever o comportamento das partículas de plasma em experimentos de fusão nuclear - plasma é o estado quente e carregado da matéria composto de elétrons livres e núcleos atômicos que representam 99% do Universo visível.

Os aparatos de fusão nuclear mais amplamente utilizados são os tokamaks, estruturas em forma de anel que confinam o plasma usando campos magnéticos muito poderosos. A fusão, a força que alimenta o Sol e as estrelas, combina elementos químicos leves na forma de plasma para gerar grandes quantidades de energia. Inúmeras equipes estão tentando replicar a fusão na Terra para criar uma fonte virtualmente inesgotável de energia para gerar eletricidade.

O grande desafio é controlar esse plasma, para que a reação de fusão seja sustentada e controlada. E é nisso que Qin está interessado.

"Em um dispositivo de fusão magnética, a dinâmica dos plasmas é complexa e multi-escala, e as leis efetivas disso, ou modelos computacionais para um processo físico particular que estamos interessados, nem sempre são claras," disse Qin. "Nesses cenários, podemos aplicar a técnica de aprendizado de máquina que desenvolvi para criar uma teoria de campo discreta e, em seguida, aplicar essa teoria de campo discreta para compreender e prever novas observações experimentais."

Bibliografia:

Artigo: Machine learning and serving of discrete field theories
Autores: Hong Qin
Revista: Nature Scientific Reports
Vol.: 10, Article number: 19329
DOI: 10.1038/s41598-020-76301-0
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