Redação do Site Inovação Tecnológica - 09/10/2023
Plastrão
Existe uma espécie de aranha que vive toda a sua vida debaixo d’água, apesar de ter pulmões que só conseguem respirar o oxigênio atmosférico - ela só vem à superfície esporadicamente para recolher o ar de que precisa.
Como isso acontece? A aranha-de-água (Argyroneta Aquatica) possui milhões de pelos ásperos e repelentes à água que prendem o ar ao redor de seu corpo, criando um reservatório de oxigênio e funcionando como uma barreira entre os pulmões da aranha e a água.
Esta fina camada de ar é chamada de plastrão e, durante décadas, os cientistas têm tentado imitar seus efeitos protetores, o que pode permitir a criação de superfícies superhidrofóbicas capazes de prevenir a corrosão em oleodutos e plataformas de petróleo, o crescimento bacteriano e a adesão de organismos marinhos em navios, as incrustações químicas e vários outros efeitos deletérios dos líquidos nas superfícies. Mas os plastrões biomiméticos criados até agora revelaram-se altamente instáveis debaixo d'água, mantendo as superfícies secas durante apenas algumas horas no laboratório.
Agora, pesquisadores da Alemanha, EUA e Finlândia finalmente conseguiram desenvolver um plastrão superhidrofóbico estável, que se manteve funcional por meses embaixo d'água. Embora a viabilização da utilização em grandes estruturas petrolíferas e navios exija que essa durabilidade alcance anos, meses já é suficiente para pensar em várias aplicações práticas, sobretudo no campo da biomedicina.
"A pesquisa em materiais bioinspirados é uma área extremamente interessante que continua a trazer para o reino dos materiais feitos pelo homem soluções elegantes evoluídas na natureza, que nos permitem introduzir novos materiais com propriedades nunca antes vistas," disse a professora Joanna Aizenberg, da Universidade de Harvard, nos EUA. "Esta pesquisa exemplifica como a descoberta desses princípios pode levar ao desenvolvimento de superfícies que mantêm a superhidrofobicidade debaixo d'água."
Biomimetismo
Um dos maiores problemas com os plastrões é que eles precisam de superfícies ásperas para se formar, como os pelos da aranha-de-água. Mas essa rugosidade torna a superfície mecanicamente instável e suscetível a qualquer pequena perturbação de temperatura, pressão ou pequeno defeito de fabricação.
A equipe conseguiu agora identificar uma série de parâmetros, incluindo informações sobre a rugosidade da superfície, a hidrofobicidade das moléculas da superfície, a cobertura do plastrão, os ângulos de contato e outros, que, quando combinados com a teoria termodinâmica, permitiram descobrir se o plastrão de ar seria estável ou não.
Com esse conhecimento e uma técnica de fabricação simples, os pesquisadores projetaram uma superfície aerofílica feita de uma liga de titânio de baixo custo. O resultado é um plastrão de longa duração, que manteve a superfície seca por milhares de horas a mais do que experimentos anteriores, e ainda mais do que os plastrões de espécies vivas.
"Nós usamos um método de caracterização sugerido por teóricos há 20 anos para provar que a nossa superfície é estável, o que significa que não só criamos um novo tipo de superfície superhidrofóbica extremamente repelente e extremamente durável, mas também podemos ter um caminho de fazer isso de novo com um material diferente," disse Alexander Tesler, responsável pelos experimentos.
Testes e aplicações
Para provar a estabilidade do novo material, os pesquisadores dobraram-no, torceram-no, jatearam-no com água quente e fria e o lixaram com areia e aço para tentar bloquear a superfície aerofílica. Mesmo depois disso, as amostras sobreviveram 208 dias submersas em água e a centenas de mergulhos em líquidos de várias densidades, incluindo sangue.
Nos experimentos práticos, a superfície superhidrofóbica reduziu fortemente o crescimento das bactérias E.coli e de cracas na superfície onde foi aplicada, além de interromper completamente a adesão dos mexilhões.
Até conseguir melhorar a durabilidade para os níveis de aplicação industrial, a equipe está voltando seus esforços para as aplicações biomédicas, onde o material poderá ser usado para reduzir infecções pós-cirúrgicas ou como implantes biodegradáveis, como stents.
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |