Redação do Site Inovação Tecnológica - 06/08/2025
Híbrido de cristal e vidro
Controlar o fluxo de calor é essencial para um sem-número de tecnologias, dos motores e geradores de energia ao resfriamento dos aparelhos eletrônicos e à própria reciclagem do calor que precisa ser dissipado no funcionamento das máquinas e equipamentos.
Otimizar o desempenho e a durabilidade dos materiais usados nessas diferentes aplicações envolve essencialmente compreender como a composição química e a estrutura atômica de cada material (por exemplo, sua estrutura cristalina, vítrea, nanoestruturada etc) determinam sua capacidade de conduzir calor.
Tipicamente, materiais cristalinos (cristais, metais etc) e materiais amorfos (vidros e cerâmicas) têm propriedades opostas de condução de calor. Os primeiros são ótimos condutores de calor, esquentando muito rapidamente, o oposto ocorrendo com os segundos. É bom para muitas coisas, mas inviabiliza qualquer tipo de controle mais aprimorado.
Mas agora uma colaboração entre teóricos e experimentalistas confirmou pela primeira vez a existência de um material com propriedades térmicas híbridas, de cristal e de vidro. É um mineral que veio do espaço, mas cuja compreensão poderá viabilizar sua fabricação aqui na Terra.
A física fundamental por trás desse comportamento inusitado aumenta o conhecimento sobre os materiais usados no gerenciamento do calor e deverá ajudar a projetar novos materiais para operação sob diferenças extremas de temperatura - na verdade, a descoberta promete até mesmo fornecer informações sobre a história térmica dos planetas.
Mineral espacial
Há cerca de cinco anos, os membros teóricos da equipe descobriram uma nova forma de propagação do calor, o calor viscoso. Eles derivaram uma única equação que captura as tendências opostas de condutividade térmica observadas nos cristais e nos vidros e, mais importante, descreve o comportamento intermediário de materiais defeituosos ou parcialmente desordenados.
E esses estados intermediários são casos muito especiais e interessantes, incluindo materiais usados em termoelétricas para recuperação de calor residual, células solares de perovskita e revestimentos térmicos para isolamento, por exemplo.
Utilizando aquela equação, eles estavam agora investigando a relação entre a estrutura atômica e a condutividade térmica em materiais feitos de dióxido de silício, um dos principais componentes da areia, mas também de toda a nossa tecnologia eletrônica. Os resultados indicaram que uma forma específica de dióxido de silício, chamada "tridimita", descrita na década de 1960 como típica de meteoritos, apresentaria as características de um material híbrido entre cristal e vidro, com uma condutividade térmica que se manteria inalterada com a temperatura.
Os teóricos então se juntaram a uma equipe de experimentalistas, que obteve permissão do Museu Nacional de História Natural de Paris para realizar experimentos em uma amostra de tridimita de sílica esculpida em um meteorito que caiu em Steinbach, na Alemanha, em 1724.
Os experimentos confirmaram as previsões: A tridimita meteórica tem uma estrutura atômica que fica entre um cristal ordenado e um vidro desordenado, e sua condutividade térmica permanece essencialmente constante na faixa de temperatura experimentalmente acessível de -193.15 °C a 106.85 °C.
Usos da tridimita
E não precisaremos ir ao espaço minerar tridimita. A equipe prevê que esse mineral pode se formar até mesmo a partir do envelhecimento térmico dos tijolos refratários usados nos fornos para a produção de aço, embora o processo seja lento para uma extração comercial.
Na verdade, materiais derivados da tridimita poderiam ser usados para controlar com mais eficiência o calor intenso envolvido na própria produção de aço, ajudando a reduzir a pegada de carbono da indústria siderúrgica - 1 kg de aço emite aproximadamente 1,3 kg de dióxido de carbono.
Os mecanismos quânticos que governam o fluxo de calor através de materiais híbridos de cristal e vidro também podem nos ajudar a entender o comportamento de outras excitações em sólidos, como elétrons portadores de carga e magnons portadores de spin na hematita, o mais conhecido dos minérios de ferro. Pesquisas sobre esses tópicos estão moldando tecnologias emergentes, incluindo dispositivos vestíveis alimentados por termoelétricos, computação neuromórfica e dispositivos spintrônicos, que exploram o magnetismo para o processamento de informações.
Além disso, o comportamento incomum de transporte térmico no híbrido cristal-vidro guarda analogias com o efeito invar na expansão térmica, que permite sintetizar materiais com coeficiente de expansão termal tendendo a zero.
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