Redação do Site Inovação Tecnológica - 24/10/2025

Unidades variáveis de tempo
Observe um relógio analógico e você verá que os tracinhos que representam os minutos ou os segundos têm todos o mesmo espaçamento. Não é por acaso que há um esforço contínuo para tornar mais precisa a definição do segundo, já que é assim que melhoramos a precisão dos relógios.
Então, talvez pareça um contrassenso construir um relógio cuja unidade fundamental não seja um evento precisamente definido, mas eventos totalmente aleatórios, com durações aleatórias.
Mas é justamente isto que Kacper Prech e colegas do King's College de Londres estão propondo - e eles já demonstraram matematicamente que esse relógio de "segundos variáveis" medirá o tempo com precisão e confiabilidade.
É famosa a frase de Einstein, de que "Tempo é qualquer coisa que um relógio meça". Dando-lhe razão, os físicos defendem agora que, embora os relógios comuns façam tique-taque em intervalos regulares, eventos que não seguem um padrão predeterminado também podem ser usados para medir o tempo.
"Nosso objetivo era descobrir os ingredientes mínimos necessários para construir um relógio. Por exemplo, você ainda conseguiria medir o tempo com precisão mesmo estando preso em uma ilha deserta? Encontramos equações que mostram como criar um relógio contando eventos aleatórios ao seu redor, como ondas quebrando na praia ou seus batimentos cardíacos," explicou o professor Mark Mitchison.

Relógio mais preciso possível
A grande descoberta da equipe consiste em um conjunto de equações matemáticas que descreve como transformar qualquer sequência de eventos aleatórios em um relógio. Eles defendem que essas fórmulas podem ajudar a entender os processos biológicos fundamentais, como as máquinas moleculares, o transporte de proteínas, descobrir como as células do nosso corpo medem o tempo e muito mais.
Por exemplo, alguns processos consistem em "saltos" tipicamente aleatórios ocorrendo em intervalos irregulares. Se cada salto depende apenas do salto anterior, o processo é chamado de markoviano - uma cadeia de Markov (Andrey Andreyevich Markov [1856-1922]) é um modelo matemático usado para descrever uma sequência de eventos aleatórios. Exemplos podem ser encontrados em toda a natureza, desde nossos batimentos cardíacos até a flutuação dos preços das ações.
Usando as novas equações para analisar esses saltos, é possível estimar quanto tempo passou e estabelecer o limite matemático mais estrito até o momento sobre a precisão desse relógio.
E talvez seja aí que reside outro grande interesse nesse relógio de segundos aleatórios: Detectar os efeitos da mecânica quântica no mundo em escala humana.
"Este acaba sendo o melhor relógio possível que se pode construir contando eventos markovianos em um sistema regido pela física clássica. Portanto, se você encontrar um sistema que não segue o padrão esperado, pode ter certeza de que algo mais está acontecendo, como um comportamento quântico subjacente," explica o professor Mitchison.

Detectar a quanticidade do Universo
Cronometrar processos naturais que ocorrem em saltos pode ter implicações de longo alcance, ajudando a entender proteínas com movimentos rítmicos que apresentam mau funcionamento em doenças neurodegenerativas ou receptores químicos que as células usam para detectar toxinas prejudiciais.
Mas também pode ajudar a resolver um dos maiores enigmas da ciência moderna: Quando é que a física clássica deixa de funcionar e a mecânica quântica passa a vigorar? Alguns físicos acreditam que há uma fronteira entre o quântico e o clássico, enquanto outros pensam o contrário, que não há fronteira entre o mundo quântico e o mundo clássico.
Se o relógio agora proposto se comportar de forma diferente do que as equações sugerem, então não se trata de um processo markoviano clássico e pode haver efeitos quânticos subjacentes no sistema. Da mesma forma, relógios que usam física quântica não são restringidos pelo limite, o que explica por que tecnologias quânticas, como os relógios atômicos, podem ter um desempenho melhor do que qualquer relógio clássico.
"O tempo está no cerne de muitos mistérios não resolvidos da física quântica. Por que o tempo parece fluir em apenas uma direção? Por que nos lembramos apenas do passado e não do futuro? O tempo é quantizado em blocos discretos, da mesma forma que a energia? Ao refletir sobre o que os relógios podem fazer, esperamos, em última análise, responder a algumas dessas perguntas sobre a natureza do próprio tempo," concluiu Mitchison.